Meu Carandiru
- Aragonés Errante
- 31 de mai. de 2021
- 2 min de leitura
Atualizado: 5 de out. de 2021
Assisti o filme faz tempo, acredito que ainda não conhecia pessoalmente o Brasil, fiquei impressionado, não conhecia sequer uma pessoa que passou pela cadeia e minha imagem de um preso era bem distante, o filme relata em duas intensas horas como era a vida no Carandiru antes do massacre que acabou com 111 pessoas mortas. Histórias de vida, de amor, de sofrimento, que acontecem de igual maneira dentro e fora de um muro e que a longa consegue despertar a empatia com muitos dos detentos e com suas vivências.
Em 2002 o complexo penitenciário, o maior da América Latina, foi desativado e no seu lugar foi construído o parque da Juventude, o projeto executado pela arquiteta Rosa Kliass tinha como objetivo uma transformação, uma resignação do espaço e da forma que era utilizado. Casualidades da vida (ou não) este aragonês acabou, por indicação de uma grande amiga, morando a poucos minutos deste ponto que visito com frequência.
Mas foi hoje, bem cedo, entre as sombras e luzes do amanhecer de um dia cinza em São Paulo que surgiram algumas ideias e que me animaram a tirar umas fotografias. Desculpem a ousadia de este aprendiz de “escritor” que agora quer dar uma de fotografo. Pode ser que seja uma ideia metafisica demais para essa segundona, mas pensemos juntos, me acompanhem.
Vou pegar o Carandiru como analogia, respeitando logicamente a memória das pessoas que faleceram aquele 12 de outubro de 1992, como também de quem passou desde 1920 por esta casa de detenção.
Provavelmente seja meu texto mais positivo desde que brinco de escritor, contraditório olhando as imagens de um lugar que poderíamos descrever como sombrio.
A luz da esperança vem do tempo, um dos vilões mais clássicos, porém hoje torna-se herói, para nos mostrar uma coisa que todos nós sabemos, mas que resistimos a aceitar. Nada é para sempre, o Carandiru, um monstro de enormes dimensões, com mais de 80 anos de história, com apoio de governos, da sociedade, hoje não existe mais.
As pessoas agora se divertem, passeiam, crianças correm e brincam, acredite, a antiga estrutura serve de cenário para ensaios fotográficos de casamentos o que outrora só trazia dor, hoje é local de alegria, e se voltássemos a 1990 ninguem acreditaria onde eu me senti muito tão bem nesta manhã chuvosa de maio.
E você como eu que já nos sentimos presos em uma situação, um problema, um trabalho que não gostávamos, uma perda familiar, sei que é difícil acreditar, mas nada disso é eterno, e ficaram as cicatrizes como ficaram os muros e a passarela dos pavilhões, que nos farão lembrar do que passamos, de que conseguimos superar e que agora, neste momento, atravessamos por elas caminhando orgulhosos, um pouco mais sábios, um pouco mais fortes.
Pense em todos seus problemas, faça um exercício mental, qual será o tamanho de seu Carandiru ou seu Alcatraz em 5 anos? E em 10? E em 20? Eu pessoalmente não me lembro de muitos, de outros sinto saudades, outros servem como lembrança do que consegui superar, mas todos eles me fazem enxergar que minhas carceragens físicas ou mentais um pouco menores, menos importantes, me fazendo algo mais livre do que um dia imaginei ser.


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